29 de setembro de 2006

Rugosas Protuberâncias

Escandido.
O ferro!

Aplauso no terceiro balcão!

Entre o riso e a lágrima,
a leve dor, a inocência

O amado(r) fruto da leviandade

Escandir o desejo!

Tergiversar por aí.
Paladinas ausências
Rumorejar de marés.

Inolvidado solo
em mi bemol maior

Faustosa sala
dos encardidos tectos

Faunos e Cromeleques.
Proto-história operática

Inusitadas crepitações
Rugosas protuberâncias

Circunflexas áreas
do devir afectuoso

Quinto acto
mentes cristalinas

Barrocas e intempestivas
preces da afabulação

Complacentes viagens
nas bambolinas régias

Ocaso visceral
Fecha-se o pano

No salão nobre
o vison

a visão polifónica

o ouvido metafísico

o paladar metateatral

o olfacto policromático

Tacteio a breve espuma
dos dias negros de paz
no limbo dos diáfanos
rostos solitários.

22 de setembro de 2006

Jazzin` Tondela 2006



(clique na imagem para obter mais informações)


3º Festival de Jazz ACERT
4 Out Qua Ester Andújar Quarteto + Ximo Tebar [Espanha]
Ficções

5 Out Qui Westbrook Trio [R. Unido]
Carlos Bica Trio

6 Out Sex Floros Floridis Trio [Grécia]
Ruben Alves Trio

7 Out Sab Drumming
Carlos Peninha Quarteto

20 de setembro de 2006

Como vos dizia ainda há pouco, depois do memorável campo de férias num recanto da já de si recôndita Tanzânia, regressei. Teve de ser, quanto mais não fosse porque tinha marcada uma consulta com o psi a que não poderia faltar.

Assim que entrei no seu consultório, o Doutor Martins – vou chamar-lhe assim porque é mais seguro, já todos vimos filmes em que os psis são atacados por pacientes, ou isso ou assaltam-lhes os consultórios em busca de quaisquer informações, este mundo está cada vez pior; e também porque suponho que ele prefira manter o direito à sua privacidade; como se tais motivos não bastassem, chamo-o assim porque é esse o seu nome – o Doutor Martins, dizia, abandonou a “Elle” que folheava; cumprimentámo-nos, "shodotor, como está?", e deu-se início à sessão.

Depois de alguma conversa de circunstância, perguntou-me o que tinha feito nas férias. Relatei-lhe os principais acontecimentos, e isso deixou-o pouco menos que assombrado. Tentei acalmá-lo, dizendo que não estava perante um potencial assassino ou perturbador da ordem pública, uma coisa é frequentar campos de treino da Al-Kaeda – isso mesmo, com “k”! – outra é andar por aí a matar pessoas.

- Não gosto de matar pessoas; - afiancei-lhe então. Mas logo rectifiquei: - Não é que já o tenha alguma vez feito, matar pessoas, entende? Só que me parece que não deveria fazê-lo, por isso digo que não se deve fazer disso ocupação.

Perante o seu olhar inquisidor, tentei aquietá-lo, contando-lhe isto:

- O mais próximo que estive disso foi quando, em miúdo, arrancava uma asa às moscas que apanhava. Depois fechava várias moscas numa caixa de fósforos vazia e deixava que a natureza seguisse o seu curso. Imaginava qual delas sobreviveria por mais tempo.

Ele soergueu-se um pouco da poltrona:

- Ah sim? Isso é assaz interessante!

- Ora, coisas de miúdo! Mas por falar em assaz, por vezes também as punha em cima do fogão e ficava a vê-las espernear, debatendo-se contra o calor que acabava por fulminá-las.

O psi teve uma reacção inesperada a estes relatos da minha infância.

- Sabe, tive um episódio parecido com esse. Quando era miúdo, os meus pais levavam-me muitas vezes à quinta dos meus avós, em Trás-os-montes, e lembro-me de uma vez em que, – e aqui começou a esboçar um sorriso – na Primavera, fui até ao batatal ver o caseiro a aplicar o pesticida nas batatas, curá-las, disse-me ele. Nunca tinha visto aquilo! Falo dos escaravelhos, uns bichinhos castanhos. Havia milhares deles por toda a folhagem. Então, fui buscar uma caixa de biscoitos vazia que tinha achado na arrecadação, e apanhei tantos insectos daqueles quanto pude; enfiei-os na caixa, fechei-a e enterrei-a ali perto. E não me lembrei mais disso durante o tempo em que estive na quinta.

Aquela confissão, de tão inesperada, deixou-me aturdido, a pensar no que faria ali, pelo que tratei de me levantar apressadamente e de me despedir tant bien que mal do Dr. Antunes, ou Martins, ou Soares, a pretexto de um compromisso inadiável de que me teria esquecido. Esta estranha sessão terminou, portanto, bastante mais cedo que o previsto, e senti-me aliviado ao chegar à rua.

Nos dias seguintes, como se deambulasse pela casa meio macambúzio, uma vizinha que vendia melões à beira da estrada perguntou-me se estaria disposto a ajudá-la na venda. E depois de acertarmos o pagamento pelo serviço, lá fui passar as tardes junto à carrinha de caixa aberta, a vender melões e a ouvir a Antena 1 (cortesia da Dona Lucinda, assim se chamava a minha patroa).

Como estávamos ainda em Agosto, o tema de conversa entre nós e os clientes era quase sempre o mesmo. Que todos os anos era a mesma vergonha, prometia-se que no ano seguinte não seria assim mas depois o caos repetia-se, que eles deviam era ser todos expulsos do país (e isto era o mais leve das penas decretadas ali mesmo, à beira da estrada). Falo, como terão já calculado, das transferências falhadas de craques para os nossos “grandes” do futebol, que todos os Verões assumem contornos de drama nacional. E que a culpa, dizia-se, era dos jornalistas, e que muitos deles eram já reincidentes, que anunciavam a contratação de jogadores de topo que afinal não se confirmavam, e o povo, sedento de reforços, deitava as mãos à cabeça quando os via rumar a outras paragens, ele foi o Tomasson, o Saviola, este ano o Tristán, e um com o nome parecido com Piccoli, houve até um presidente que cometeu a heresia de despedir o treinador porque este queria o Hesselink, ou Helsínquia ou coisa que o valha. Ou seja, o alvoroço habitual dos verões portugueses.

E lá ia conversando com os clientes sobre tudo isso, até que comecei a fartar-me do assunto, e comecei a ouvi-los falar respondendo apenas com acenos de cabeça. E depois já nem lhes respondia; eles falavam, eu aproveitava para comer uma fatia de melão, atirando as cascas para o meio da estrada, vendo-as ser despedaçadas pelas rodas dos veículos que passavam (isso distraía-me das conversas). Só que a paciência tem limites, a minha pelo menos, por isso comecei a responder aos clientes com alguns impropérios. E um dia, reconheço-o agora, excedi-me. Uma família inteira lamentava-se do “sistema do futebol português” há mais de dez minutos quando me levantei do banco onde me tinha sentado, bradando:

- Esses gajos precisavam era que lhes fizessem como nós fazíamos quando encontrávamos um sapo nas cercanias da casa. Púnhamo-lo numa extremidade de uma tábua e saltávamos sobre a outra extremidade; catapultávamo-lo e ficávamos a vê-lo voar bem acima das nossas cabeças, e por vezes conseguíamos ouvir o som abafado que fazia ao embater no chão! Ah, isso é que era, hã!

Não sei se por causa do meu tom de voz, se terá sido do meu furioso gesticular, ou ainda devido aos salpicos abundantes de saliva, o certo é que a família inteira (homem, mulher, duas crianças e um poodle chamado Miki, ou Mickey ou lá o que era, debandou rapidamente, deixando o saco de melões que tinha já pesado e se aprestava a pagar. Isto foi demais para a minha patroa, que se abeirou de mim furiosa:

- Olha lá, ó meu paspalho, que parvoíce foi essa?

- ... (é que nem tive tempo de responder!)

- Então faz-se isso aos clientes? Hã? Assim dás-me cabo do negócio! Quem diabo pensas que és, seu fedelho?

- Eu... Eu sou Aquele que É.

- Olha, não quero saber de mais nada. Desaparece-me daqui, já!

- O meu Ego não é deste mundo. Se o meu Ego fosse deste mundo... – nesta altura parei, porque não me lembrava do resto da frase. De qualquer modo, a Dona Lucinda já não me ouvia; tinha-me voltado as costas e saído dali apressadamente.

Assim acabou o meu trabalho de Verão, e pude finalmente voltar ao descanso que já merecia.

9 de setembro de 2006

Estreia Trigo Limpo Teatro ACERT

(clique nas imagens para ampliar)

TRIGO LIMPO teatro ACERT T 232 81 44 00, E trigolimpo@acert.pt, www.acert.pt

8 de setembro de 2006

Férias bombásticas

Farto da modorra – nem Sodoma nem Gomorra – deste país, abalei “daqui para fora” e fui fazer um campo de férias junto de terroristas árabes. Inscrevi-me no site da Al-Jazeera (a Al-Jazeera tem um uma versão do “Um Contra Todos” muito engraçada: quando o concorrente perde implode-se em pleno estúdio, depois de uma mensagem à família; estas implosões são um dos grandes picos de audiência da estação).

A viagem foi longa, demorou 93 horas. Saí de Lisboa e fiz escalas em Madrid, Husqvarna (Suécia), Istambul, Dacca (Bangladesh), Phnom Pen (Cambodja) e Cartum (Sudão), antes de aterrar em Dar-es-salam, a capital da Tanzânia. (Confusos? Com fusos horários tão diferentes e tantas horas de vôo, imaginem a minha disposição à chegada... o que vale é que pude passear durante 4 horas em Phnom Pen; gostei da cidade, fez-me lembrar Caneças e Casal de Cambra e deu para desentorpecer as pernas).

Bom, mas falava do aeroporto de Dar-es-salam, não era? Aí fomos recebidos por um grupo de pessoas ostentando um cartaz onde se lia: “I LOVE AL-KAEDA”. Dirigi-me a eles e saudámo-nos efusivamente. Perguntei-lhes porque escreviam “Al-qaeda” com “K”, e explicaram-me que fazem sempre assim, porque as “Secretas” das potências ocidentais localizam e capturam os terroristas através da pesquisa no motor de busca Glu-glu, e o “k” serve para os despistar. Engenhoso, não? Depois tomámos um transfer para o luxuriante
Parque Nacional do Serengeti, onde se realizou o campo de férias.

Em Cartum cruzei-me com o
vladivostok. Trocámos breves palavras; disse-me que estava em trânsito e ia participar num seminário ultra-secreto sobre métodos de tortura a aplicar a dissidentes norte-coreanos. Ainda tentei suavizar a conversa, perguntando-lhe se estava em trânsito... intestinal, mas ele não achou piada – consta que leva estas coisas muito a sério – por ali mesmo deixámos a conversa, enquanto nos dirigimos para os respectivos terminais.

De vez em quando cruzava-me também com agentes secretos norte-americanos nos aeroportos. Usavam blusões azuis que nas costas tinham bordadas as palavras “USA” e “SERVICES”. No meio delas estavam as marcas da palavra “SECRET”, cujas letras haviam sido arrancadas, o que levou a que apenas olhares atentos como o meu os conseguisse detectar.

Já no campo de férias, o ambiente era espectacular. Todos os participantes (e até alguns dos monitores) eram oriundos de países do “Primeiro Mundo”. Tivemos vários workshops mais light (cultura islâmica, reconhecimento de inimigos do mundo árabe, tertúlia de anedotas e outros ditos sobre judeus – onde o principal assunto debatido era o ritual da circuncisão). Havia também módulos mais específicos (fabrico artesanal de bombas, orientação geográfica – muito útil para sabermos para que lado fica Meca), máquinas alternativas – neste módulo tive a infelicidade de dizer que era mau quando até já o alterne era feito por máquinas... os prazeres da vida estavam a perder-se... em suma, insurgi-me contra a robotização crescente do trabalho que provocaria uma crise laboral sem precedentes entre as mulheres que se dedicam ao “negócio do prazer”.

Mas dos módulos mais “técnicos” e exigentes ninguém se lembra de muito do que foi dito, porque entretanto descobrimos que uns australianos tinham kif, de modo que a partir daí passámos os dias a fumar. A descontração era tanta que uma noite quis fazer uma demonstração de uma pega de touro (há dois anos passei o Verão em Salvaterra de Magos). E pus-me a provocar um búfalo que por ali cirandava... só que quando se aproximou, investindo furiosamente, apercebi-me que não se tratava de um búfalo, mas de um rinoceronte... mal tive tempo de subir à árvore mais próxima. E pensar que apenas pretendia mostrar um pouco das nossas tradições aos meus colegas...

Uma tarde fui surpreendido por uma inesperada revelação, depois da aula de “Reconhecimento dos inimigos do Islão”. Nessas aulas eram-nos mosradas fotos de Beorge Gush, Duís Lelgado, Edolf Aichmann, Ohud Elmert, - nomes fictícios -, e nós recebíamos essas fotos com mimos como: “Esse filho de trinta cadelas!” ou “Hei-de ir c****-te à porta!” ou ainda “Antes uma cárie que o Macário!”. No final dessa aula, dizia, o monitor, sabendo que era português, contou-me que duas pessoas que agora vivem em Portugal já participaram destes campos de férias. Depois de alguma insistência da minha parte, disse-me que se trata – pasmem-se!” do Sotoka e do Manrottas, que não obtiveram aproveitamento no módulo “Implosão pública”, tendo daí resultado danos físicos dificilmente reparáveis.

Ai, ai... Já sinto a falta daquele ambiente sadio, no meio da Natureza, em plena África... África-mãe, África-amiga! Na última noite estivemos todos a fumar (até os monitores!). A conversa foi animada e deambulava já no ar uma atmosfera de nostalgia. Andou-se de tenda em tenda, em longas e por vezes disparatadas conversas. Até que o chefe do acampamento veio à minha tenda e, por via da embriaguez, me fez algumas incofidências. Disse-me que um dos livros preferidos de Beorge Gush é “O Estrangeiro”, de Camus, e que a sua música preferida é “Killing an Arab”, dos The Cure. Mas a confissão mais estonteante estava para vir. Num tom de voz grave e embargado, contou-me um segredo daqueles que poderão mudar o mundo, tal como o conhecemos.
- Sabes, Língua? – começou Arash, o meu interlocutor. – A história das setenta virgens que esperam avidamente os mártires de Alá no paraíso é uma completa falácia.
- Como? Que dizes? Flá... fel... uma falácia? – respondi, a rir. Mas a sua reacção silenciou-me.
- Então vamos pensar juntos. São setenta, as virgens, certo?
- Sim...
- Então, a partir do momento em que a primeira delas é desflorada, as outras ficam em sessenta e nove!
Fez-se silêncio, enquanto tentava perceber o que acabava de me ser dito. Até que me apercebi do significado disso e da gravidade de que aquela revelação se revestia, no contexto da geopolítica mundial.
Arash meneou solenemente a cabeça, como se dissesse: “Agora já sabes. Toma cuidado contigo, rapaz”.
Despedimo-nos e fui dormir, indiferente aos ruídos de causas várias que vinham das outras tendas.

No dia seguinte, entre lágrimas, abraços e trocas de souvenirs, iniciei a longa viagem de regresso ao meu país. Passei o resto das férias a pensar naqueles quinze dias no campo de férias. Mas mais aconteceu, já em Portugal... em breve vos contarei.

Já sou grande. Já posso pernillar!

Boa tarde. Sou o Vladivostok, e preciso de ajuda. Sou "pernillaholic". Por favor ajudem-me a sair desta vida de devassidão e loucura que me consome vários minutos todos os dias ... Já não consigo passar sem uma ou duas pernilladas diárias. E o principal culpado da minha desgraça é o Língua Morta que me trouxe pra estes caminhos de insanidade e desvario...

6 de setembro de 2006

`tamos na casa!


"Sinto-me culpada/o quando toco acidentalmente
entre as pernas do meu urso de pelúcia"
(foto retirada do PostSecret)


Ah, vai ser tão bom, não foi? Vocês sabem do que falo – das férias, pois então! Fomos espalhar o nosso charme para outros lados, andámos por aqui e por ali, a fazer isto e aquilo... “Meu querido mês de Agosto”, proclamava Nel Monteiro, uma das referências da música nacional. E se ele sabe o que diz... era terem-no visto uma destas manhãs no “Fátima”, entalado entre o “Top signos” da Maya e o Donaltim da “árvore das patacas”.


Mas lá fui espreitando a página, e senti um daqueles alívios quando, num radioso dia, constatei que já havia três (!!!) comentários. É que a partir daí já não teria de dizer
“Que bom ler ambos os comentários!”
mas em vez disso, e com todo o júbilo

“Ui, que bom ler todos estes os comentários!”
E todos os comentadores são já, ouso afirmá-lo de peito aberto e perna cruzada, pernilleiros indefectíveis.

- Há o al cardoso, que se desdobra agora em três blogues;
- O vareta, que se desdobrou em recomendações (“I get pleasure with other people`s leisure”, dizia o esticadinho de Trainspotting, e essas palavras assentaram que nem uma luva ao V). Como se não bastasse, partilhou connosco a sua inquietação! A nossa preguiça é poderosa! Até lhe desculpo as inconfidências que revelou sobre o ano passado, que perdoar é uma coisa muito bonita!
- O Castanheira Maia, que também se desdobra! (e mais não digo!)
- A Bel, melhor dizendo A Artista Blogosférica Previamente Conhecida Como Mata Hari, num comentário cheio de “Oooooooooooo`s”
- Depois veio o rpm (rotações por minuto? NÃO! Rui Pedro Matos!)
- E finalmente - last but least - tresvariou o vladivostok; foi mais um comentário-catarse, onde expurgou toda a crueza das vivências tenebrosas com que lida diariamente, a falta de ideais e valores, numa amoralidade sem paralelo. Resquícios de anos tenebrosos passados no gulag da Mrs. Pity.

Caríssimos: vós sois os verdadeiros pernilleiros, os convictos, com toda a estigmatização que isso traz às vossas vidas. Admitir que se lê (e comenta!) a Pernilla é quase tão mau, em termos sociais, como confessar que se vê o programa da Paula Moura Pinheiro ou que se lê a coluna diária do Eduardo Prado Coelho no "Público". Dá para ter uma ideia, não dá? Daqui a nada teremos de criar os pernilleiros anónimos, antes que a situação se torne irreversível.

E para não dar azo a especulações, em breve (amanhã, daqui a dez minutos, enfim...) contar-vos-ei um ou outro episódio das férias..