26 de dezembro de 2007

Estugado Passo

O horizonte ficou límpido. Finalmente, o bafiento pó foi sacudido pelo tempo.
Um derradeiro olhar aos escombros da carne putrefacta. Detritos em demasia
no inacabado estertor das ruas. Com passo largo vou sugando as imagens do desvario,
há humidade a mais no silêncio da noite. Fui a correr em busca do teu gesto, mas
tinhas-te voltado para o passado, qual estátua de Lot feita de sal. Cloreto de Sódio
no teu coração, perigosa e alta tensão na tua vida. Peguei na mão do carteiro e fui viajar,
por entre praias nuas e campos pintados de neve. Nunca mais voltei a cantar! O meu fraco
som nem sequer aquecia os pássaros, quanto mais a nuvem carregada de espectros.

Tive sede e escrevi-te um beijo. Na hidrólise dos afectos há massacres em surdina,
nanoguerras de alecrim e manjerona. Nas aromáticas veredas do sonho, há loiça para
quebrar. Cacos de fealdade e uma sinapse nervosa e complacente. É preciso ler nas
entrelinhas de um comboio atrasado e fumegante. Foi calma a madrugada de livros.
Pétalas de punhais e massagens suaves em digressão mundial. O sistema é quem mais
ordena e as estrelas não vivem sem rei nem rock. Calhaus desabitados de dor, uma fúria
remanescente e um saldo positivo no teu olhar. Depois de tanto cambiar, fiquei com a
pedra preciosa e ridícula na mão. Na hemorragia do verbo, há silêncios de ouro ao luar.

16 de dezembro de 2007

Kathleen Connally

É uma fotógrafa Norte-Americana. Tem um site que faz parte da nossa lista: http://www.durhamtownship.com/ (Durham, Pennsylvania). Adoro o seu trabalho! De uma grande qualidade e sensibilidade. Depois, as magníficas paisagens de Durham e arredores, no Estado da Pennsylvania, também ajudam. Aqui fica uma amostra! É o meu postal de natal antecipado.
Kathleen Connally, 6 de Dezembro
Título: "Sierra"

13 de dezembro de 2007

Coral de Letras na Casa da Música dia 16 Dezembro - 12 horas

O Coral de Letras da Universidade do Porto actua na Casa da Música dia 16, Domingo, pelas 12 horas, um concerto único com um repertório assinalável e de grande nível, dirigidos pelo Maestro José Luís Borges Coelho. Um Coral que já "canta" 41 anos de existência, sempre com o mesmo maestro titular. Com uma série de prémios acumulados e alguns concertos fora de portas, o Coral prepara-se agora para mais uma actuação com obras que vão de Fernando Lopes-Graça a Filipe Pires, passando por Schubert, Poulenc e Eurico Carrapatoso, entre outros.
É já Domingo, dia 16 na Casa da Música (Sala Suggia) . Eu vou lá estar, de ouvidos atentos!
Se estiverem pelo Porto, não faltem. Bilhetes a 5 €. Jovens até 18 anos: 1 €.

12 de dezembro de 2007

Álbum de família

Eu era Hamlet. Encontrava-me à beira-mar e falava com a rebentação - blabla. Por detrás de mim as ruínas da Europa. Os sinos anunciavam o funeral do Estado, assassino e viúva um par, em passo de ganso atrás da urna do eminente cadáver, os conselheiros lamentando-se num luto mal remunerado QUEM É O CADÁVER NO CARRO FUNERÁRIO / POR QUEM SE OUVEM TANTOS GRITOS E QUEIXAS / O CADÁVER É O DE UM HOMEM / GRANDE DADOR DE ESMOLAS entre as fileiras da população, obra da sua arte de estadista ERA UM HOMEM QUE SÓ TIRAVA TUDO DE TODOS. Fiz parar o cortejo fúnebre, enfiei a espada no caixão, partindo-se a lâmina. Com o que dela restou consegui abri-lo e dividi o procriador CARNE VAI BEM COM CARNE pelas figuras de miséria que por ali se encontravam. O luto transformou-se em júbilo, o júbilo em voracidade, sobre o caixão vazio o assassino atirou-se à viúva - QUERES QUE TE AJUDE A TREPAR, TIO? ABRE AS PERNAS, MAMÃ. Deitei-me no chão e escutei o mundo a girar ao passo cadenciado da putrefacção.

Excerto de "A Máquina-Hamlet", de Heiner Müller (trad. Anabela Mendes)

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"Alma Grande" em Viseu - Teatro O Bando

Inserido numa digressão por terras do centro, O Bando vai actuar nos seguintes locais:
Coimbra - 14 Dezembro, Teatro da Cerca de São Bernardo, 21:30
Oliveira de Frades - 15 Dezembro, Cine-teatro Dr.Morgado, 21:30
Dia 17 de Dezembro, a não perder em Viseu, no Teatro Viriato, o espectáculo "Alma Grande" pel'O Bando, adaptado de um conto de Miguel Torga ("O Alma-Grande" in Novos Contos da Montanha). Um espectáculo de rara beleza, em versão de câmara (interior de uma sala), com bons actores e uma grande sensibilidade.
Info: http://www.obando.pt/ ou http://www.teatroviriato.com/

6 de dezembro de 2007

J-Acto!

Maria, és a minha mais amada Pernilla
Um oboé de sabores alcalinos, uma fonte
de inesgotável energia. Duras o suficiente
para dar luz às trevas. Cada macaco no seu
galho das protuberantes vozes em desalinho.

Consolidar a posição, uma empresa de sucesso
São Pernilladas na fronte dos opíparos doutores
Está na hora de mudar o mundo, mas vou começar
pela minha casa. Corto cerce o jardim dos afectos,
recolho as folhas do pranto e pego na tua mão para jantar.

Processo o computador para parar de te ver. Não quero
estar contigo! Tu és um verdadeiro animal e eu sei que
não vou aguentar o teu corpo nu e sedento de sexo.
Chega! Sou agora um monge retitrado no mais alto e
esconso ermitério, talvez esteja nos locais sagrados de Meteora.

Sons que já foram férteis, agora só pedras e gado asinino.
No meio de nenhures uma paz e um sossego imperturbáveis.
Mas quando me lembro de ti, vou buscar a foto, aquela em
que te revelas e eu desvelo-me ao mais agudo prazer. Após
a infâmia, volto a colocar-te no sagrado livro dos Cânticos de Salmos.

4 de dezembro de 2007

Natural Mente

Cheguei-me ao preâmbulo da tua vida e disse-lhe adeus
Nas labaredas de fome, queimei o sacrossanto altar da saudade
Partimos para a violência verbalizando nódoas negras de prazer
No fio de prumo das paixões arrebatadoras persegui-te até ao fim do mundo

Enquanto a cidade dorme eu estou na lenta agonia do meu pranto
Tento criar novas utopias nas mãos de um abominável e dandy poeta
Nos traços largos de uma tela bem disforme, há tonalidades nacaradas de ódio
A guerra fria do teu corpo é um olhar penetrante nas carcomidas vielas da solidão

Mas e depois do adeus às armas, que corpos consomem a bonomia de um verão azul?
Nas falésias rancorosas da tua pele há estragos inelutáveis, ferida aberta e exangue da memória.
Passos perdidos na reunião dos homens das decisões soberanas. Há amargura nos rostos!
Depois, homicídios em demasia. Um afamado vinho à saúde de todos os suicídios colectivos!

Quero libertar-me das roupas quentes que me atiçam a morbidez dos sentidos.
Prefiro nudez sacrificial e carne dilacerada para jantar. Depois o sexo, temperado a azeite.
Dieta mediterrânica numa orla só para nós, uma duna que nos faça sentir, sentindo-nos.
Ter a cortesia de não incomodar as aves de rapina na salsugem do êxtase demasiado.

Por fim, o fim! Largar horrores de um subalternizado campo minado e inodoro.
Atirar-te ao mar toda inteira e perene, sacrificar-te na ara do meu desejo.
Sinto novamente a combustão desta zona intersticial e a aspergir de vida.
É tempo de afogar as palavras num posfácio demasiado breve e conciso.