Alkantara Festival 2008
"No início do século XIX, Hegel argumentou que a história humana se desenvolvia em sentido crescente, criando sociedades cada vez mais sofisticadas, equilibradas e justas. Há 15 anos atrás, o politólogo americano Francis Fukuyama concluiu que a humanidade tinha finalmente chegado ao fim desta história e alcançado a organização ideal: um sistema bicéfalo de democracia liberal e capitalismo global. Duas décadas depois, esta esperança algo ingénua tornou-se um fracasso óbvio. As diligências da administração Bush para exportar a ‘sua’ democracia, deram no que está à vista: guerra, intolerância, desprezo pelo direito internacional. A globalização do capitalismo correu bastante melhor, mas os resultados também são conhecidos: uma fossa crescente entre ricos e pobres, uma catástrofe ecológica à escala mundial e a supremacia da ganância e do consumismo.
Numa coisa Fukuyama tinha razão: a falta de alternativas credíveis é estrondosa. Para manter o nosso nível de vida, diz-se, a economia precisa de crescer e para isso acontecer, os nossos governos e as nossas empresas têm de primar no jogo dos mercados. Hoje em dia, o raciocínio é tão impregnado que até parece uma lei da natureza. Não é de estranhar, dizem os pensadores da biopolítica: a sofisticação da nossa sociedade de consumo é tal, que os indivíduos interiorizaram a sua própria opressão. Se produzir e consumir estão intimamente interligados (a produção alimenta o consumo e o consumo sustenta a produção), formando a base da nossa prosperidade, nada é mais importante do que formatar o indivíduo enquanto produtor/consumidor. O primeiro objectivo da política tornou-se o controlo e a gestão da população, do bios, da vida de cada um de nós. E nós assim o queremos, porque nenhum preço parece alto demais para a segurança e a prosperidade, nada parece mais importante do que salvaguardar e aumentar a capacidade individual de consumir. Instalou-se a sensação de que a nossa liberdade coincide com o nosso poder de compra.
Em tempos de pensamento único precisamos de vozes dissonantes. Quando a vida parece afunilar-se num consumismo frenético, precisamos de descobrir outras vias. Já não há ninguém que ouse sugerir que a arte pode salvar o mundo, mas contra todas as tendências de massificação e entretenimento (pois, a arte também se tornou num produto de consumo), há quem continue a ver e praticá-la como forma de resistência. Como uma tentativa de visitar os mundos que se escondem atrás do mundo aparente. Como uma maneira de questionar o que é geralmente aceite, facilmente absorvido ou simplesmente cómodo."
Numa coisa Fukuyama tinha razão: a falta de alternativas credíveis é estrondosa. Para manter o nosso nível de vida, diz-se, a economia precisa de crescer e para isso acontecer, os nossos governos e as nossas empresas têm de primar no jogo dos mercados. Hoje em dia, o raciocínio é tão impregnado que até parece uma lei da natureza. Não é de estranhar, dizem os pensadores da biopolítica: a sofisticação da nossa sociedade de consumo é tal, que os indivíduos interiorizaram a sua própria opressão. Se produzir e consumir estão intimamente interligados (a produção alimenta o consumo e o consumo sustenta a produção), formando a base da nossa prosperidade, nada é mais importante do que formatar o indivíduo enquanto produtor/consumidor. O primeiro objectivo da política tornou-se o controlo e a gestão da população, do bios, da vida de cada um de nós. E nós assim o queremos, porque nenhum preço parece alto demais para a segurança e a prosperidade, nada parece mais importante do que salvaguardar e aumentar a capacidade individual de consumir. Instalou-se a sensação de que a nossa liberdade coincide com o nosso poder de compra.
Em tempos de pensamento único precisamos de vozes dissonantes. Quando a vida parece afunilar-se num consumismo frenético, precisamos de descobrir outras vias. Já não há ninguém que ouse sugerir que a arte pode salvar o mundo, mas contra todas as tendências de massificação e entretenimento (pois, a arte também se tornou num produto de consumo), há quem continue a ver e praticá-la como forma de resistência. Como uma tentativa de visitar os mundos que se escondem atrás do mundo aparente. Como uma maneira de questionar o que é geralmente aceite, facilmente absorvido ou simplesmente cómodo."
Mark Deputter /programador cultural e director do Festival Alkantara
/texto completo aqui
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