domus e as tetas
excepto a razão".
AS TETAS DA ALIENAÇÃO
[Adolfo Luxúria Canibal / Miguel Pedro]
testemunha ocular da miséria mental que é mistificar a tristeza banal de viver a juntar tanta coisa vital para a vida vulgar parecer divinal e com isso ocultar a pobreza real de um gesticular reduzido a sinal não consigo calar a origem deste mal que nos anda a atacar a todos por igual tudo assenta no consumo e produção são as tetas desta nossa alienação trabalhar ou morrer é-nos dado escolher o trabalho é direito transmutado em dever não se pode morrer já lá diz o preceito e se formos a ver não há nada a escolher para sobreviver o trabalho é foral não morrer consumindo não se chama viver o consumo é o aval para se ir produzindo e com seu acrescer fecha o ciclo infernal tudo assenta no consumo e produção são as tetas desta nossa alienação são as tetas o consumo e a produção são as tetas da nossa alienação
Esta é a letra de um dos temas de "Há já muito tempo que nesta latrina o ar se tornou irrespirável", lançado pelos Mão Morta em 1998. Para esse trabalho, o primeiro depois do seminal (e sublime!) "Müller no Hotel Heissischer Hof", a banda inspirou-se nos movimentos anarquista e situacionista.
A despropósito, podem ler ou reler "A Sociedade do Espectáculo", que aqui postei há cerca de um ano. Aliás, podem lê-lo quantas vezes quiserem - mas uma vez será suficiente.
Quase tão inevitável como o pagamento do IRS em Março ou Abril, o calendário traz-nos, já bem embrulhadinho em papel reciclado, o Natal em Dezembro. Aliás, especula-se por aí que, a partir do próximo ano, o Ministério da Solidariedadezinha publicará no seu sítio oficial a lista dos portugueses que não se deixem enlevar pelo espírito natalício. Como diziam os "Felizes da Fé", cai o karma e a Trindade.
É nesta época natalícia que se enxota a malícia e se torna mais evidente a "unificação feliz da sociedade pelo consumo" de que fala Guy Débord. E é contra este paradigma ("paradigma" é um daqueles termos que explica o que não se consegue explicar bem - fiz-me explicar?) que odeusdamaquina se insurge. Contra a adulteração do nosso modo de vida, amarrado ao consumismo e ao fogo-fátuo da "Sociedade do Espectáculo".
Natal rima também com centro comercial. Os centros comerciais são, tal como os aeroportos, as grandes cadeias de hotéis ou os casinos, aquilo que amistosamente se apelida de "não-lugares".
Um não-lugar é um espaço desprovido de elementos que o diferenciem dos demais, demasiado artificializado. Os grandes aeroportos internacionais são quase tão idênticos como as lojas franchisadas: lembram-se da personagem que Edward Norton interpretou em Fight Club - Clube de Combate? Por passar o tempo a viajar pelos aeroportos da América do Norte e por diferentes fusos horários - é caso para dizer que ficava confuso horário - a voos tantos já não sabia onde estava, que dia era; e vejam o que acabou por fazer...
Os centros comerciais procuram recriar indoor as praças e os jardins que vão escasseando nas urbes. E se estes se tornam não-lugares, também as pessoas tendem a tornar-se... não-pessoas, através dos comportamentos, postura, linguagem que utilizam - tanto os vendedores como os potenciais clientes. Quando o empregado de balcão da loja de comida rápida nos diz "Obrigado" poderá muito bem estar a pensar: "Vá, agora desocupa-me o balcão, que está gente à espera". Economizam-se as palavras e a cortesia. Observado de longe, o movimento dos centros comerciais assemelha-se a um formigueiro: os gestos são repetitivos, maquinais.
Acaba por ser engraçado, é como observar os passageiros do metropolitano. Funny in a kinky way. Afinal, todas as pessoas andam por ali a satisfazer os seus desejos / necessidades de consumo. E nestas alturas, com esses espaços atafulhados de gente, é interessante observar-lhes as expressões, desde o sorriso - mais ou menos franco - ao mau humor mal disfarçado, do desprendimento de quem anda por ali simplesmente a passear à inexpressividade de quem já entrou em piloto automático; "Se não te calas levas um par de estalos!", a paciência já não mora ali. Tudo electronicamente vigiado, os agentes de segurança são extensões das câmaras de vigilância.
Nos centros comerciais encontram-se três tipos de pessoas:
- as que não passam sem uma visita regular, para fazer compras, passear ou simplesmente conviver - "aqui sou tão feliz!";
- as que abominam os centros comerciais e adoptam a nobre causa do comércio tradicional - "ah, nada como um sorriso genuíno, a disponibilidade e a sinceridade do atendimento personalizado... bem, mas olha-me só aquela loira na caixa quatro, é tão impessoalmente... boa!"
- as pessoas pretensiosas como eu - "isto é o máximo, enquanto faço as compras tenho a oportunidade de andar pelo meio das pessoas a observá-las, parece um laboratório de Sociologia ao vivo! Fuck, aquele #gadget# é muito mais barato aqui que no retail park lá da terra!"
Colemos as pontas soltas deste texto, se tal for ainda possível. Este post é como um novelo com várias pontas, e cada um que pegue na que mais lhe aprouver. Escrevo em itálico para compensar a declinação magnética da Terra.
Citação: "A contestação da abundância capitalista é apenas aparente, mais uma daquelas acções que se executam apenas para estar de acordo com o padrão imposto por uma sociedade. O consumo turva a vista da maioria dos seres humanos que deambulam pela sociedade do espectáculo." Fim de citação.
Quem citei? Nem mais nem menos que a personagem blogosférica previamente conhecida como Mata Hari que, como lhe competia, andava a espiar os meus escritos e comentou "A Sociedade do Espectáculo". Pois é, Mata. Mas que fazer? Respondem os Mão Morta em "Vamos fugir": "... a única fuga é a loucura". Ou, à falta dela, a ironia (com ou sem pretensiosismo).
Broas, Frestas e Boas Festas!
5 Comments:
Até que enfim que esta latrina se tornou irremediavelmente anti-natalícia, anti-propícia aos dislates consumitas, anti-prepúciana, anti-Centro Comercial de Belém, anti-Centro Cultural da Dolce Vita. A Doce vida, que nos transforma em seres diabéticos, em seres cariados, e os médicos é quem lucra, as farmácias, as lojas de produtos naturais. Produtos naturais? Nada mais falacioso. Quem faz um filho, é com o falo. Com gosto!Com sabor, com textura aveludada, com aroma de essência de melão verde e sarapintado de couve de Bruxelas. A Europa ainda manda! Sem Europa não somos nada. Sem Renas, sem rendas para pagar vamos dormir no passeio público. públicas virtudes num desolado edifício privado. Privatize-se o natal! Contratualize-se a diminuição das despesas correntes com as prendas, as prendicas, as prendocas, as bombocas.
Boas bocas para dilacerar o astuto e vil metal, a vil nota no esgoto do escroto. Palavras conspurcadas, palavras acetilénicas, os furanos da sorte, a libidinosa morte. As tretas das tetas rijas e imberbes, as tetas sedentas de um abraço, os domus municipalis, os orçamentos rejeitados, os conluios desbravados. O Situacionismo estástico, o bota de elástico. Plástico na névoa artificial. Pistas de gelo na manhã diabólica. A tarde é dos santos! E a noite, é dos loucos. Dos bêbedos, dos friorentos, dos sardentos, dos sargaços, dos abraços.
Foda-se para esta vivência, para o excesso de vidência! nesta época apetece-me ser o mal natal, apetece-me ser o mais ignóbil dos espectros rastejantes, o camaleão com sede, o veado com fome!
Foda-se e mais foda-se, obscenizar por aí, surrealizar por aqui, erotizar por acolá. Cá e lá são fartas as farturas fritas. Foda-se esta factura que temos de pagar. apetece-me o além-mar, apetece-me afogar. apetece-me reivindicar. apetece-me um rei, sem roque, sem a música do passado, apetece-me o xadrez mundial, apetece-me a fria guerra dos sentidos, a luta entre o bolo rei e o bolo Inglês. Apetece-me o doce! preciso de comer, preciso de mamar nas tetas grossas e abundantes, quero a glucose, o sabor agradável para o meu cérebro, quero a diabetes de dia, quero os sorvetes de noite. quero a serotonina activada no meu frágil cérebro, quero a teobromina, a fenilalanina, todos os 20 aminoácidos essenciais a que tenho direito. Já que todos os outros direitos eu perdi-os, desperdicei-os, lancei-os ao vento.
Quero o carmo e a trindade, a prostituta da saudade, a velha e desdentada greta garbosa.
Quero suicidar a festarola, a rola, a parola e indigente maneira de me ver ao espelho! Quero ser velho! Quero o absinto para ver se sinto novamente! Quero a piedade, a mortadela e o vinagre. Pimenta da Caiena, Cocaína e Hiena. Quero as editoras a editarem-me, a sufocarem-me de temor. Estou farto de humor! Estou farto de horror. Estou farto de escritores sem dó nem piedade, sem verdade! Quero matar e morrer! Quero matar as vendilhonas do templo, as "sei lá" porque escrevo, as Tamaro, os crimes do padre amaro, ai...se não me agarram eu não paro!
Pega ladrão, fazes comichão ao mundo, fazes as fezes com um cheiro nauseabundo.
Cantigas do cagalhão, putas que querem caralhão, vidas que querem um abanão!!!!!
FODA-SE!!!!!!
Tesão de Escrever!
Onde andas Natália?
Que saudades tenho eu do POPOFF!
Que saudades tenho eu de ter a idade do tempo do POPOFF.
Entao "{Broas}" Festas para ti tambem.
Um abraco, e Felix Natal.
Parabéns Língua Morta!
Admiro a tua forma d'escrita e o teu pensamento!
A propósito... à guisa de resposta(?!): fui aliciado a visitar esta fétida degeneração, usando as tuas palavras, por ti mesmo nos idos de Abril numa leitoniana boda...
Um abraço... A gente vê-se por aqui!
Venho deixar o desejo que o Natal deste ano seja, o mais possível, o reflexo dos valores do Presépio de há dois mil anos. João Lopes
Boas festas Língua
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