6 de fevereiro de 2010

A Única Vocação deste País

A única vocação deste país é esquecer.
Cruzar a fronteira - linha imaginária do desejo - e não mais saber do burburinho
saloio daquela música de fundo. Cantores de fatiota retro e voz anasalada.

Sair, obliterarmos a comezinha vida dos jargões alcandorados na via pública
das virtudes inconsequentes. Demasiado difícil? Nem pensar em responder
ao afecto bacoco das naus catrinetas. Agora, sair e esquecer. Amparar as
dúvidas na filosofia e prosseguir em frente, rumo à esquerda do meu pensar.

Nas minhas mãos, a escrita perene e entusiasmada. Fragmentos de mar
e congestão inusitada de locuções. Nada mais me interessa, senão partir.
A única vocação deste país é esquecer.

Não é aviltar contra a insónia que a margem se comprime mais.
É discorrer sobre o universo da infâmia, da sarna acumulada no
leito do navio. Dentro do tonel, o lastro vínico das borras lamacentas,
o álcool à deriva na erosão dos corpos mutilados da contradança.

A vocação deste país é gerundizar.
Ir andando ao sabor da maré.
Se for salgado é uma saudade embriagada.
Se for doce, uma utopia anquilosante.
Se for amargo, um futuro deprimido.
Se for ácido, uma poesia de nervos e carne.

No aroma delicodoce de um verbo, há escárnio e maldizer em barda.
Por ora, fixo o meu olhar para a raia, cruzar o bordo dessa linha invisível.
É assaz preciso a inquietação do crítico, pois a modorra geral é o busílis da vida.

A única vocação deste país é esquecer.
Cortar as amarras do navio e permitir a livre circulação de pessoas e animais.
Uma fronteira inefável, sem nevoeiros insossos e um ror de gente a querer lembrar.