11 de setembro de 2007

Onde é que você estava no 11 de Setembro?

- O quê, ontem?
- Não! Em 2001!
- Ah, isso... atravessava a pé a ponte de Santa Clara para ir trabalhar – começara há pouco a trabalhar num asilo de alienados - quando apareceu o meu colega esbaforido a anunciar que tinham derrubado as Torres Gémeas, e eu imediatamente
- Isso é inacreditável! O Almirante e o Tim Duncan lesionaram-se ao mesmo tempo?

Explicou-me pacientemente que não, tratava-se antes de um atentado em pleno World Trade Center por um grupo terrorista chamado Al-Qaeda. Era o dia 11 de Setembro, e apercebi-me do requinte de malvadez dos terroristas: 11 por causa da forma dos arranha-céus, e Setembro por causa daquela música do José Alberto Reis “Setembro é o mês da saudade, e as memórias que teço, não esqueço” ou coisa que o valha.

Lá seguimos o caminho, ele contando-me o pouco que (ainda) se sabia acerca do ocorrido, eu ouvindo atentamente até que chegámos ao Asilo, os alienados não falavam de outra coisa, a Teresa assim para o atarantada, dias antes viera ter connosco ainda a lacrimejar

(ainda não tinha chegado à fase do “Sabe, tenho de lhe confessar que já não aguento mais aturar aquelas cabras!", deixando-me sem resposta, "passou-se" pensei, mas isto foi uns meses depois, não se pode responsabilizar o 11 do 9 por tudo)

Mas aquilo lá no trabalho foi rápido, a verdadeira acção estava para chegar, ou melhor já estava no 7A (ui que bom!), quando lá cheguei – “honey, I`m home!”; estava lá quase toda a gente, todos literalmente excitados com o ocorrido – nas várias formas de excitação possíveis, até o Boris ladrava incessantemente. A TV bombardeava-nos – por assim dizer - com imagens de puro terror, mas ao mesmo tempo fortemente cinematográficas, e toda a gente cirandava pelo pátio-quintal a comentar. Estava lá o Adolf, a contorcer os lábios e as sobrancelhas, enquanto disparava os habituais "os políticos são todos uns merrrdas", e de vez em quando sorria, olhávamos a TV estupefactos, a absorver tudo aquilo, até que me fartei da ladainha dos comentadores e alguém foi buscar uma velha cassete; daí a nada ouvia-se "Rita Hot Pussy" dos Lulu Blind ou "On Our Way to Fatima" dos The Great Lesbian Show", a banda sonora perfeita para um final de tarde de Verão com imagens que pareciam anunciar o final dos tempos. Andava por ali também o João Pinto, que repetia: "Que caga, meu!". O Paulo de Tomar olhava o televisor antes de este ser silenciado e dizia: "Mas quando? Mas quando?!" e nós calados, respeitando o seu estado, até que momentos depois, completava: "Mas quando é que te calas?"

Por lá andava também o Alhinho, que citava Ratzel a cada dois minutos: "a guerra é a arte de passear a fronteira pelo território vizinho!" e nós: "Coitado, vejam o que a Antropologia faz a uma pessoa...", algo condoídos. Até que vi o Sérgio, era o que parecia mais calmo, afastado do turbilhão de emoções e patetices. Perguntei-lhe: "Então, pá? Que me dizes de tudo isto?" E ele: "Doctor, isto é dramático" e meneava a cabeça. Pouco depois chamou-me de parte: "Olha lá, podes emprestar-me o teu quarto para esta noite?"

Entretanto chegou o Toni, que logo foi rodeado por todos, cada um a querer ser o primeiro a contar as novidades. Teve de levantar a voz e afastar-nos com os braços: "Vão com calma, já sei de tudo! Vi há pouco na televisão. Já não me excitava assim desde que ganhei a Liga dos Campeões com o Newcastle", e as olheiras dele denunciavam a noitada que passara a jogar CM - o Toni ganhou o nosso respeito desde que ganhou duas ligas holandesas com o Ajax no espaço de 24 horas. Pouco depois chegou também o ZéManel, que dizia: "Já viram bem aquilo? Quem diria que uma coisa destas viria a acontecer..." Assentimos com a cabeça, e ele prosseguiu: "Já imaginaram a quantidade de mulheres ali naquele sítio à procura de um ombro amigo para desabafarem, a quem contar as mágoas? Tsk, tsk..." E, abanando a cabeça, dirigiu-se à sala.

O último a chegar foi o Vladivostok. Como é óbvio, já sabia de tudo, e após as palavras de circunstância: "Pá, hoje esteve uma caloraça!" chamei-o a um canto. "Então, já falaste com os contactos da Alexanderplatz?" e ele "Não, fiquei sem bateria, estava a tentar ligar quando vinha no 46 e a chamada caiu." "Então terei de ser eu a fazê-lo, suponho." "É, parece que sim. Quanto antes lhes ligarmos melhor."

Só que não tinha saldo no telemoque, por isso tive de ligar ao meu pai e pedir-lhe para mo carregar. "Podem ser 2 contos?" ""2 contos? Precisava para aí de dez!" "Dez? Muito falas tu! Ainda estou para saber com quem falas, que tanto dinheiro gastas". Mas lá a cedeu, e daí a minutos falei rapidamente com os berlinenses, o que não serviu de muito, pois já estavam bêbados (ou ainda estavam, com eles nunca dava para saber). Então o Vlad sugeriu que ligasse aos norte-coreanos. Fiquei a espumar de raiva, mas lá teve de ser. Eles não acreditavam no que estava a acontecer, e após a chamada comentámos: "Bolas, aqueles tipos são mesmo cépticos!" E o Vladivostok riu com gosto, e respondeu: "Eles são é doidos! Vê lá que eles continuam a acreditar que a Lady Di continua viva, que aquilo foi tudo uma encenação e ela é empregada de mesa em Venice Beach, usa agora o nome de Camille Apara-Bolas. E eles dizem ter informações em como ela fez um casting para um filme do David Lynch!" Aquilo foi demais! Rimos a bandeiras despregadas, o que despertou a atenção dos nossos colegas. "Estamos a ter uma catarse", dissemos embaraçados.

Esta frase como que nos despertou para a realidade, e subitamente todos ficámos pensativos e angustiados. Apercebemo-nos que o mundo poderia estar na iminência de um conflito global, e a nossa inquietação era cada vez maior. O Fuji até prometeu que a partir daí passaria a desfazer a barba todos os dias. E o Alhinho esteve perto de choramingar quando disse que tinha medo de ter de ir à tropa. Dissemos-lhe: "À tropa? Pois se tu nem barba tens? Nem te deixavam entrar no quartel!" Replicou, ofendido e falando depressa: "Pois não foi isso que me disseram neste Verão, nos Palheiros da Tocha!" E nós, subitamente curiosos: "O que foi? Conta lá!" Muito insistimos, mas ele baixou os olhos e repetiu: "Não quero falar sobre isso. Não vou falar mais sobre isso."

Nisto ouvimos o barulho de passos na escada de ferro em caracol. Não restavam dúvidas: era a Mrs. Pity que vinha ter connosco, no seu andar arrastado. Encontrou-nos inquietos e logo abriu os braços: "Venham cá, meninos, não tenham medo! Agora que o Tio Sam não vos pode albergar debaixo da sua cartola, vinde! Deixem que vos conforte no abraço caloroso do meu seio!". E lá fomos, dois de cada vez, quais crianças assustadas, tomar conforto no seu volumoso regaço. Alguns de nós - não direi quem - soluçavam.

Depois disso, já todos estávamos mais calmos. A Mrs. Pity retornou aos seus aposentos e fomos jogar matraquilhos. Foi uma bela jogatana, e o João Pinto no final rematou: "Que caaaaga, meu!"

1 Comments:

Blogger odeusdamaquina usou da palavra

Eis um grande texto do nosso Tate!
Uma galeria de histórias superiores! Amigo Tate (é melhor tratar-te pelo nome de família), Ariel é um nome muito limpinho!

Já agora, eu estava na escola secundária, a dar formação em Nutrição, quando trabalhava no Centro de Saúde. Acabado isso, a minha coordenadora, e as funcionárias da escola (cozinheiras, auxiliares) disseram:
- É o Fim do Mundo! É a terceira guerra mundial! O mundo vai acabar hoje!
E eu: - Ora porra! Logo hoje que tinha jantar à pala em casa da minha namorada! Da-se!

13 setembro, 2007 18:26  

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