5 de maio de 2012

Li-ber-da-de


Uma nova era que transforma o infinito em mar salgado do desespero. Na cama dos amantes há um bafo quente de miséria e solidão. Cais no precipício primordial do mundo e socorres-te da paisagem nublada para a morte antecipada do amor. Era o tempo em que as estrelas sabiam a doce e o amante, figura pálida e seminal, acorda de um sonho profundo, na liberdade angustiante de um beijo. Percorreu as ruas, que estavam despidas de gente e deitou-se na gravilha branda da saudade. Só lhe apetecia chorar na sua ensimesmada dúvida existencial. Morreria agora, ou alcançaria finalmente o zénite da pureza. A noite chegara e as nuvens adensaram-se num pranto incomensurável. No outro lado da vida, a amante dilacerava cebolas em barda, para poder lacrimejar sem pejo na amargura do silêncio, daquele silêncio nauseabundo e aromático. Separados à nascença, o choro e o riso aguçaram-lhes a vontade de exteriorizarem as emoções, sem medo ou culpa, sem o derredor da infâmia. Pátria calada nos sumiços da verdade, ensanguentada virtude nas guerras ultramarinas, vício e sexo na oralidade fragmentada da escravidão, lastro de ditadura na madeira carcomida do poder. Essa música inquieta e perturbante, fulmina como um raio de luz, uma ocre diatribe nas mentes recolectoras da ânsia de uma vida finalmente nova e feliz. E escavam a manta de retalhos do pútrido afecto determinista da existência, querem um novo ciclo de amor e morte. Sempre de mãos dadas, os amantes reconciliam-se na espera hospitalar dos condenados, pacientes inquietos de desejo e loucura. O obsessivo passo é feito nas montanhas e nos rios, desagua freneticamente na dor da escolha, fertiliza o nascer do prazer nas lezírias plácidas da liberdade. Que fazer agora, dizia o poeta, com as palavras à solta, como crianças rebolando na erva doce do futuro? Sujando letra a letra o tenro corpo diabólico e doce? Vocábulo a vocábulo se fez a perífrase do amor, finalmente pudemos arrumar as botas cardadas que nos exilavam na vida amordaçada e inconsequente. Por agora, finalmente, juntar as sílabas e partilhar a alegria da fealdade pairando nas nuvens da imaginação.